Entenda a manobra política do governo com a intervenção federal no RJ




Por Matheus Ávila, estudante de ciências sociais da Universidade de São Paulo (USP)


É necessário alertar a população sobre qual são as reais intenções por trás do governo com esse decreto constitucionalmente ambíguo da "intervenção federal" (visto que temos um interventor militar para manter a ordem democrática...) e sua conexão com a reforma da previdência.


No dia 16 de fevereiro, a população ficou perplexa por notícias que percorriam a mídia falando que o Temer havia assinado um decreto para "intervenção federal", porém, fora todo o rebuliço que isso causou nas mídias sociais (afinal, intervenção agora não parece algo muito “cheiroso”, não é mesmo), vamos contextualizar e elencar alguns pontos para compreender melhor o que está de fato acontecendo:


1) Pós-golpe parlamentar-jurídico-midiático-civil à Democracia e ao Estado Democrático de Direito, ou seja, entre outras coisas, isso implica ao ato simbólico de “rasgar a constituição”, uma vez que a Democracia se manifesta nas eleições diretas, e tivemos uma presidente impedida pela instrumentalização da lei. Isso significa que a constituição e a lei estão sendo usada de maneira “excepcional” segundo as circunstâncias para determinados fins políticos do grupo golpista.

Isso nos leva a 2) a intervenção federal e sua dimensão ambígua. Visto que tivemos o golpe e o ato simbólico do “rasgar da constituição”, isso significa que temos uma intervenção que É e NÃO É CONSTITUCIONAL, ao mesmo tempo. Ela está sendo usada com um instrumento essencialmente político. E para que seria isso então?

Isso nos leva ao ponto 3) a reforma da previdência e o rebaixamento do Brasil no ranking da S&P. No final do ano passado, tivemos as manchetes e noticiários divulgando que o Brasil tinha caído no ranking da S&P (de BB para BB-) e que entre algumas “sugestões” para “atrair investimentos” seria aprovar o quanto antes a reforma da previdência (PEC 287/16). E vimos a tentativa desesperada do governo federal para aprovar essa reforma.

E com esses 3 pontos podemos entender como eles estão correlacionados. Se atente para algumas informações pertinentes presentes do decreto de intervenção federal e alguns artigos da constituição federal de 1988:

“O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, caput, inciso X, da Constituição, DECRETA:

Art. 1º Fica decretada intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro até 31 de dezembro de 2018.”

(...)

“Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

X – decretar e executar a intervenção federal;

(...)

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

§ 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.

(...)

Art. 167. São vedados:

§ 3º A abertura de crédito extraordinário somente será admitida para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública, observado o disposto no art. 62.

(...)

Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional. (Redação dada pela EC n. 32/2001)”.

Se você se atentou bem ao que está grifado nos trechos citados acima você conseguiu compreender a conexão existente.

O governo federal está instrumentalizando a intervenção federal como uma manobra política para forçar a aprovação da reforma da previdência. Isso nos levaria duas possibilidades:
A) O governo não possui o número de votos o suficiente para aprovar a reforma semana que vem e estaria usando dessa "cartada" como uma forma de conseguir ganhar tempo e meios necessários para conseguir agenciar os votos, e:

B) Estamos em ano eleitoral, e era para o governo federal ter passado essa reforma faz tempo, porém, não conseguiu. Ou seja, como conciliar a necessidade “mercadológica” de se aprovar a reforma e a necessidade política da reeleição quando essas duas coisas se excluem? (Isso é, quem votar na reforma, com certeza terá seu nome marcado e correrá o perigo de perder votos). Simples, votando a reforma “depois” das eleições. Só se atentar que o decreto vai até dia 31 de Dezembro de 2018, e ele poderia ser revogado a qualquer momento...

Prestemos atenção e tomemos cuidado. Podemos estar entrando num caminho perigoso para a democracia brasileira, é dever cívico resistir e se contrapor a qualquer agressão por parte do governo golpista à Democracia.


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Wesley Sousa

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