Cuba: Independência, Revolução e Democracia



                                                                                                                  - Por Ramon Carlos
                                               Postado Originalmente em oestadoalterado.blogspot.com


Como qualquer país, a realidade de Cuba é bem diversa e complexa, assim como os mais de 50 anos de sua Revolução. A visão estrangeira sobre Cuba apresenta os mais diversos absurdos, que acreditam que Cuba seja um estado policial repressivo que governa sobre o medo de seus cidadãos. A revolução passou por inúmeros processos, reinventando-se e se adaptando às dificuldades internas e externas, e precisamos entende-las ou, pelo menos, conhece-las para que esta propaganda política desleal contra Cuba seja desmistificada. Este texto tenta trazer de modo resumido os caminhos trilhados pelo país, desde os tempos e lutas pela independência até os processos de sua Revolução e suas conquistas sociais que são exemplos mundiais, principalmente nas questões de saúde e educação. 

Independência

Terra onde Hatuey, fugido da Hispaniola (hoje Haiti), pegou em armas contra os colonizadores espanhóis em 1511. O ‘primeiro rebelde da América Latina’. Cuba foi a última colônia da América Latina a libertar-se da Espanha, em 1898, em um processo que teve início em 1868. Neste ano, Carlos Manuel de Céspedes libertou seus escravos e os convocou a lutar junto dele, José Martí e Antônio Maceo pela independência do país. As ideias para uma Cuba independente eram associadas a ideias de igualdade e unidades raciais. Algo muito diferente do que acontecia nos EUA até os anos de 1960 (e até hoje têm reflexos significativos). É importante dizer que isso não significa que não existiu ou não exista racismo em Cuba, afinal, nenhuma sociedade fundada com séculos de exploração racial seja capaz de mudar este quadro de um dia para o outro.

Com o andar das lutas pela independência, a presença dos EUA no continente aumentava. Em 1848, o gigante do Norte avançava para o Oeste, anexando territórios antes pertencentes ao recém independente México. Então, em 1898, os EUA invadem a ilha e a ocupam militarmente até 1902. Implantaram a Emenda Platt*, que definia na constituição cubana, o direito de uma intervenção militar americana caso os interesses e as propriedades americanas fossem ameaçados, ampliação da extração de carvão, além de construírem bases navais, como é o caso de Guantanamo. Esta influência americana na ilha, total dominação política, econômica durou até 1959. Com isso, com exceção de Porto Rico, nenhum país latino americano teve um período tão longo de influência americana como Cuba, o que, de certa forma, ajudou a moldar uma parte da cultura e o senso de identidade nacional.

*Que o governo cubano permita que os EUA exerça o direito de intervir no sentido de preservar a independência cubana, manter a formação de um governo adequado para a proteção da vida, a propriedade, a liberdade individual. [...] e, para proteger a população dali, tão bem como para sua própria defesa, o governo de Cuba deve vender ou alugar terras aos Estados Unidos, necessárias para a exploração de carvão para linhas férreas ou bases navais em certos locais especificados de acordo com o Presidente dos Estados Unidos. (Morris, 1956, p182-3)

Em 1905, 60% das terras rurais eram propriedade de cidadãos ou empresas americanas. 90% do comércio de tabaco eram controlados por investidores americanos, além de terem também controle de minas de ferro, cobre e níquel, sem contar os sistemas de ferrovias, energia e comunicação. [1] Cuba tinha um status colonial que durou até a Revolução, em 1959.

A crise de 1929 afetou dramaticamente a economia Cubana que dependia de exportações. No início da década de 1930, trabalhadores rurais e urbanos, estudantes, intelectuais e uma grande gama de cidadãos cubanos optaram pela ação direta e a luta armada. Durante este período, o embaixador americano Sumner Welles e o exército cubano fizeram algumas articulações por baixo dos panos e, mesmo Fulgencio Batista tendo liderado uma revolta militar contra o escolhido de Sumner em 1933, Sumner via Batista com olhos otimistas, do ponto de vista americano. E assim que Grau (responsável em 1933, por retirar a Emenda Platt de vigor) decide colocar Batista como líder do exército, os Estados Unidos decidem reconhecer o governo cubano, fazendo com que Batista governe diretamente Cuba nos períodos de 1934 a 1944, [2] onde o próprio Batista era um produto da revolta de 1933, e muitos setores da própria esquerda o viam como um continuador desta, e é substituído por Grau San Martin em 1944. Batista tem seu retorno como ditador na década de 1950, tornando-se um dos principais fatores detonantes para um movimento de oposição radical, e a revolução. [3]

Na década de 1950, cerva de 1,5 milhão de pessoas eram de desempregados, trabalhadores sem terras e campesinos, que viviam a base de feijão, arroz e água com açúcar, com suas crianças sofrendo de parasitas. Haviam 900 mil pessoas que controlavam 43% da renda do país. Entre estes dois extremos, haviam 3,5 milhões de pessoas que, apesar de não viverem como as mais pobres, estavam em uma situação de risco e tinham grande dificuldade para sustentarem suas famílias, uma vez que Cuba era extremamente dependente de importados dos Estados Unidos, mas seus salários eram muito inferiores aos americanos, além de não terem as garantias sociais que os americanos possuíam. [4]

Revolução e Socialismo

Se em 1898 o exército americano impediu os rebeldes da independência de entrarem na capital de Santiago, Fidel proclama “Desta vez, os mambises vão marchar em Santiago de Cuba” em 31 de dezembro de 1958. No ano novo de 1959, o exército revolucionário faz sua entrada triunfante em Havana. A guerra havia acabado, mas dava-se início, de fato, a revolução.

Com a revolução e sua audaciosa transformação econômica, Cuba fez sua reforma agrária e chegou a quase total nacionalização da economia.

Antes de 1º de Janeiro de 1959,
          Elites latifundiárias mantinham controle quase feudal das zonas rurais, lucrando com o trabalho de uma grande classe agrária extremamente pobre. Áreas urbanas modernas serviam às necessidades de uma pequena elite ligada ao capital estrangeiro. A renda foi dissipada pela elite no consumo de bens de luxo, em vez de ser investidas na produção. O capital estrangeiro controlava setores básicos da economia. As instituições democráticas eram fracas ou inexistentes. Isso significava que o capital estrangeiro reinava supremo e que decisões importantes sobre o uso dos recursos do país eram tomadas por estrangeiros para o bem de estrangeiros.
[...] Quatro terços da terra cultivável do país eram usadas para produzir açúcar, o que representava 80% de suas exportações. 40% das fazendas e 55% dos moinhos estavam nas mãos de empresas americanas. [...] 90% dos serviços de telecomunicações e eletricidade em Cuba, e metade das ferrovias do país, além de porcentagens significativas dos setores bancário, pecuário, de mineração, petrolífero e açucareiro. (A. Chomsky, 2015, p. 56)

O economista sueco Claes Brunendius descreve a vida dos chamados guajiros, grande maioria da população, que era rural e pobre.
Ele morava num bohío, uma pequena casa de terra batida e telhado de palha de palmeira. Para 90% dos guajiros, um lampião de querosene era a única forma de iluminação e 44% deles nunca havia frequentado a escola. Apenas 11% bebia leite, apenas 4% comia carne e apenas 2% comia ovos. A dieta diária, que tinha uma deficiência de mil calorias, era o principal responsável pelo aumento constante no número de casos de tuberculose, anemia, doenças parasitárias e outros males. [5]

O principal pilar da revolução era diminuir a desigualdade entre a parte rural e a urbana. Os serviços básicos como, escolas, hospitais, eletricidade, agua encanada e saneamento deveriam chegar até o campo.

A revolução expandiu ao máximo os serviços sociais. Educação, saúde, medicamentos e previdência social, todos gratuitos ou com um custo muito baixo. Preços de transportes públicos caíram drasticamente, e os serviços sociais de água, serviços funerários e até telefones públicos também tiveram avanços. [6]

Após uma campanha de alfabetização que mobilizou mais de 300 mil jovens, em poucos meses se reduziu o analfabetismo ao nível mais baixo da América Latina (3,9%). Estabelece-se também a gratuidade do ensino, acabando totalmente com o ensino privado. Os setores de eletricidade e telefonia tiveram reduções de tarifas significativas. [7]

Em 1960, o governo revolucionário criou o Serviço de Saúde Rural, levando saúde para uma área onde a população mais pobre mal conhecia um médico. Esse serviço foi responsável pela instalação de hospitais rurais, além de exigir que os médicos recém graduados fizessem um ano de serviço social nas áreas rurais menos favorecidas. [8]




Economia

Sem entrar em muitos detalhes, Cuba teve desafios imensos em sua revolução.
No início dos anos 60, aconteceu o chamado “Grande Debate” onde os líderes revolucionários, economistas e pensadores cubanos decidiriam os rumos da economia. Primeiramente enfrentava dois problemas pós revolução: Evasão de capitais e evasão de capitais sociais.

O primeiro pode ser explicado como
Em uma economia capitalista, o investimento vem de indivíduos ou instituições privadas (como bancos), que investem seu dinheiro onde acreditam que possam obter lucro. Se um governo começa a limitar a capacidade de lucrar – seja aumentando salários, seja impondo restrições jurídicas às empresas -, os capitalistas começam a partir para outro lugar. Eles podem colocar seu dinheiro em bancos estrangeiros ou investir em empresas no exterior. (Chomsky, A. 2015, p.61)

O segundo
É comum que as classes antes privilegiadas, normalmente com maiores níveis educacionais, mais qualificações, mais contatos e outras formas daquilo que os cientistas sociais chamam de capital social, decidam fugir do país também quando notam a evaporação de seus privilégios. As instituições (escolas particulares, empregadas e restaurantes de luxo) e itens de luxo, dos quais dependem seu status, não existem mais. [...] Metade dos 6 mil médicos de Cuba, migraram nos anos que vieram logo depois da revolução. O país perde seu capital social – suas habilidades, conhecimentos e contatos -, tão importante para restaurar a economia. (Idem)

Os primeiros anos foram caracterizados por um grande sentimento de voluntarismo. Os que não concordavam deixavam o país mas, em compensação, os que ficavam, sentiam que este momento único seria de extrema importância para a reformulação da sociedade.

O planejamento socialista cubano também cometeu erros, ao desprezar a cana-de-açúcar, que era o principal produto de exportação do país, na tentativa de diversificar a agricultura. Che, então na direção da economia cubana, faz uma importante autocrítica: “Cometemos o erro fundamental de desprezar a cana-de-açúcar, tentando uma diversificação acelerada que resultou no descuido da cana, e que, junto com uma forte seca que nos castigou por dois anos, provocou uma grave queda na nossa produção açucareira”.

Durante a década de 1970 também foram introduzidas algumas políticas de mercado. Na década de 1980 foram criados, no setor de alimentação, alguns mercados privados, de forma a permitir que fazendeiros, cooperativas e fazendas estatais pudessem vender seus produtos diretamente ao público, e definirem seus próprios preços. [9]

Contudo, se a estratégia de mercado solucionou alguns problemas do socialismo – faltas de incentivo e baixa produtividade -, ele também trouxe de volta alguns problemas do capitalismo. Preços altos significam que apenas algumas pessoas possuíam dinheiro para comprar o que os mercados tinham a vender, e que os vendedores podiam obter lucros exorbitantes. [...] Os experimentos com incentivos que aumentaram a desigualdade foram até certo ponto. O compromisso do governo com igualdade continuava a reinar em outros setores, especialmente na área de saúde. [...] A equipe de médicos e enfermeiras não atendem os pacientes apenas na policlínica, mas também os visitam nos lugares que eles frequentam diariamente: casa, escola, unidades básicas de saúde e ambientes de trabalho. (Chomsky, A. 2015, p. 72-73)



Democracia, Migração e a Cuba atual

Mas afinal, o que seria a democracia?
Em um texto publicado anteriormente AQUI, já discutimos um pouco sobre como as instituições democráticas deveriam se definir.

O ocidente já tenta a décadas resumir a democracia às eleições a cada quatro anos numa lista de candidatos apoiados por grandes empresas, empreiteiras etc. Democracia não se resume ao voto. Democracia é participação popular, justiça social, igualdade e outros elementos que permitam o desenvolvimento de uma sociedade onde os direitos sejam respeitados e onde os cidadãos tenham de fato participação na tomada de decisões que afetam sua vida, que tenham acesso às informações necessárias e relevantes e que a política deixe de ser apenas mais um produto a ser consumido.

A influência americana global, principalmente com o Macartismo, gerou nos países ocidentais a associação ao socialismo com a falta de liberdades de expressão e à liberdade individual, violação de direitos humanos, repressões e campos de trabalhos.

Mas essas coisas acontecem com muito mais frequência nos países capitalistas do que em Cuba. Quantas vezes vemos policiais na Alemanha, na França, no Brasil mascarados, com equipamentos de guerra, com máscaras de gás, lançando jatos d’água na população que ousa contestar o capitalismo e suas facetas. A criminalização de movimentos sociais que estamos presenciando no Brasil, a própria seletividade de informações a qual a grande mídia utiliza como arma ideológica são exemplos antidemocráticos.

policiais franceses marcham pelas ruas portando mascaras de gas e escudos taticos

Estamos acostumados a ouvir inúmeros absurdos sobre Cuba, um país que só foi ter voz após o triunfo da revolução e que, hoje, só se manifesta no imaginário brasileiro como um lugar horrível, onde se prendem quem ousa ir contra o regime, ou onde você está preso em seu próprio território.

Cuba criou os Comitês de Defesa da Revolução (CDR’s), e junto da campanha de alfabetização e as Escolas de Instrução Revolucionárias (EIR’s), buscavam a criação do “homem novo” que Che tanto falava, por meio da mobilização e da participação.

Estamos lutando contra a miséria, mas também contra a alienação [...]. Marx estava preocupado tanto com os fatores econômicos como com suas repercussões no espirito humano. Se o comunismo não estiver interessado por isso, ele pode até ser um método de distribuição de renda, mas nunca será um modo de vida revolucionário. (Che Guevara)

Uma pesquisa de 1960, descobriu que 86% da população afirmava apoiar o governo revolucionário, sendo 43% apoiadores “fervorosos”. Sujatha Fernandes, professora de ciência política e sociologia da Universidade de Sidney afirma que o Estado Cubano

Não é um aparato centralizado repressor que exige a aplicação de suas ordens para os cidadãos de cima para baixo, mas sim, uma entidade permeável que molda as atividades de vários atores sociais ao mesmo tempo em que é constituída por elas.

Fernandes ainda afirma que, após a perda do apoio econômico e da influência ideológica da URSS, ampliou-se o espaço para se repensar a cultura revolucionária de baixo para cima.

Durante as décadas da revolução, principalmente a de 1990, os intelectuais cubanos estiveram em intensos debates sobre a democracia, sua natureza e seu significado. O acadêmico cubano Juan Antonio Blanco afirma:
Eleições não são sinônimo de democracia mas representam apenas uma parte dela. O Ocidente tenta há décadas reduzir a democracia ao exercício da votação a cada quatro anos. Para mim, a democracia é a participação diária da população em questões que afetam a vida das pessoas, e não simplesmente votar numa lista de candidatos apoiados por forças misteriosas. [12]

O cientista social Hugo Azcuy Henriquez diz ainda que o aprimoramento da democracia não deve
Ser apenas, tampouco, principalmente, sobre sistemas pluripartidários, eleições periódicas supervisionadas ou outros tópicos comuns no discurso regional sobre democracia, mas sim sobre participação popular, justiça social, igualdade, desenvolvimento nacional e outros elementos que são de maior importância para a construção de regimes democráticos estáveis e para o crescimento de sociedades em que os direitos humanos sejam respeitados de maneira mais plena. [13]

Os estudiosos envolvidos nestes debates, também apontam as instituições como as assembleias eleitas do Poder Popular, participação em organizações de massa, e canais institucionais para discussão e debate de leis e políticas são os pilares da democracia em Cuba. Eles também ressaltam que as políticas de agressões por parte dos norte-americanos contra Cuba, afetam nas atitudes do governo em determinados pontos, que podem dificultar a organização política independente, o que, segundo eles, poderia “permitir o desenvolvimento de uma oposição leal”. [14]

Esses intelectuais também fazem críticas internas às instituições políticas e econômicas, fazendo uma clara distinção entre críticas de direita, a qual rejeita a experiência socialista, baseado na propriedade privada, num sistema pluripartidário, no comercio eleitoral e nas liberdades individuais” e as críticas de esquerda, que “incluem críticas internas que ativistas partidários, acadêmicos, líderes políticos e a população cubana têm em relação ao sistema político cubano, e que pedem uma estrutura de poder mais diversificada, descentralizada e despersonalizada, e que o objetivo seja preservar o poder revolucionário e desenvolver a democracia participativa”. [15]

Mais de 2 mil associações e organizações civis foram criadas, incluindo aquelas que hoje atuam como organizações não governamentais, nos anos de 1987, e representam grupos culturais, científicos, esportivos e ambientais, entre outros. [16]

Imigração

É importante termos algumas coisas em mente. Os EUA fizeram do problema da migração um instrumento de desestabilização da ilha, após o trinfo de Fidel. Abriram suas portas aos defensores de Batista e à oligarquia do antigo regime. De 1960 a 1969, mais de 200 mil cubanos partiram para os Estados Unidos. Como comparação, o total da década anterior, de 1950 a 1959, foi de 73 mil saídas para os Estados Unidos. [10]

Na segunda metade do século XX, a emigração era algo extremamente comum, principalmente na América Central e no Caribe.
A maioria das ilhas caribenhas viu pelo menos 10% de sua população emigrar durante esse período. Porto Rico se destacou tendo a maior parte da sua população -4,9 milhões de pessoas – morando nos Estados Unidos e apenas 3,7 milhões na ilha. A República Dominicana, com cerca de 10 milhões de habitantes, teve 1,5 milhão de emigrados para os Estados Unidos. [...] Os cubanos tinham uma situação diferente sob a lei de imigração norte-americana. Muitas pessoas de outras partes da América Latina, mesmo as que fugiam de guerras, repressões e perseguições em níveis muito mais severos do que as sofridas pelos cubanos, descobriam ser quase impossível o reconhecimento como refugiados. [...] Os cubanos eram recebidos em condição de refugiados, além de programas federais para empregos, educação e moradia. Nem mesmo os porto-riquenhos, que são cidadãos norte-americanos, recebiam os benefícios especiais destinados aos cubanos. (Chomsky, A. 2015, p. 116)

Três razões explicam que a emigração maciça. Primeiro, historicamente, Cuba sempre foi um país com forte emissão migratória para o vizinho do norte. O segundo fator que favoreceu a emigração cubana para os Estados Unidos desde 1960 foi a aplicação de severas sanções econômicas contra a ilha desde julho de 1960, que foram totais em fevereiro de 1962. O terceiro parâmetro que deve ser levado em consideração é a Lei de Ajuste Cubano, em vigor desde 1966.

Também é importante analisarmos que, os EUA definiam os imigrantes de países comunistas como refugiados políticos, enquanto os imigrantes vindos de países como México e Porto Rico eram considerados imigrantes econômicos. Mas, na prática, elas se confundem. Aviva Chomsky escreve:
Tanto nos países capitalistas como nos países comunistas, os governos tomavam medidas econômicas que tinham efeitos na população e, em particular, na distribuição de recursos do país. No México, eram os pobres rurais que viam suas opções econômicas reduzidas e que migravam para os Estados Unidos em busca de trabalho, muitas vezes sob condições miseráveis, para sustentar as famílias que ficaram em seu país. Em Cuba, foram principalmente os profissionais urbanos que tiveram suas opções econômicas reduzidas pela revolução. [...] “A política norte-americana se baseava na premissa de que, nos países comunistas, as dificuldades econômicas eram resultado das políticas econômicas e, portanto, eram políticas”. No caso de um país capitalista, como o México, porém, “a política norte-americana se baseava na ideia de que a pobreza era meramente um problema econômico, não político”. (p. 118)

Embora os motivos da imigração cubana para os EUA sejam exatamente os mesmos de outros países latino americanos, é muito mais conveniente para os interesses norte-americanos, que esses imigrantes sejam resultados estritamente políticos.
Em 1980, o Presidente Carter dos EUA, devido ao fluxo de imigrantes altos, após Fidel abrir o porto de Mariel, pressionou o governo cubano a fechar o porto, em outubro do mesmo ano. [11]

Conclusão

Enquanto escutamos várias e várias vezes, que Cuba é uma ditadura, que Fidel pode ser colocado no patamar de ditador, a história de Cuba nos mostra muitas vezes que não. Fidel é sim uma figura importante em Cuba, como símbolo máximo do trinfo da revolução, mas as decisões não são ditadas por ele. Enquanto nós, no Brasil, estamos nos acostumando cada vez mais com a votação de quatro em quatro anos, e que temos a sensação de que tudo continua na mesma, uma vez que nossa democracia se restringe a isto, continuamos a ver uma diminuição significativa nas eleições e isso não significa que criamos uma consciência política de que a democracia representativa burguesa é restrita e não aceita mudanças radicais ao sistema. Enquanto isso, cuba tem uma participação popular para as assembleias que ultrapassam 80% de eleitores. [17]

Quanto a questão da imigração e as liberdades individuais, temos de entender os fatores por trás de cada aspecto, antes de replicar o discurso simplista midiático e ideológico. Os cubanos podem escolher viajar para onde bem entender, e a partir de 2013, podem fazer isto sem pedirem permissão ao governo. Mas também é importante destacar que, vivendo no Brasil, também necessitamos permissões para viajar para fora, principalmente para os EUA, que têm uma política imigratória bem restrita para os países em desenvolvimento ou periféricos e, além disso, quando saímos de nosso país, devemos informar os motivos pelos quais estamos viajando e regressar após este período. Para o caso de Cuba, fica um pouco mais dramático pelo fato de se tratar de uma ilha, e os transportes serem relativamente mais caros do que atravessar a fronteira entre Brasil e Argentina, por exemplo. [18]

Conhecer os livros indicados [*] nas referências que serviram de base para este texto, além das demais referências.

Referências
[1] Pérez, Cuba: Between Reform and Revolution, p. 192
[2] Pérez, Cuba: Between Reform and Revolution, p. 275
[3] Ayerbe, Luis Fernando - A revolução Cubana
[4] Chomsky, Aviva – História da Revolução Cubana, p. 38-40 [*]
[5] Brunendius, Revolutionary Cuba, p. 14

[6] Ayerbe, Luis Fernando - A revolução Cubana, p. 68 [*]
[7] Benjamin, Collings, e Scott, No Free Lunch, p. 17
[8] Feinsilver, Healing the Masses, p.32
[9] Dominguez, Cuba: Order and Revolution, p. 202
[11] Masud-Piloto, From Welcomed Exiles to Illegal Immigrants, p. 80-3
[12] Blanco, Talking About Revolution, p. 65
[13] Azcuy, Democracia y derechos humanos, p. 47
[14] Valdez, Democracia y Sistema Político, p. 56
[15] Valdez, Democracia y Sistema Político, p. 48-9
[16] Azcuy, Estado y Sociedade Civil em Cuba, p. 107
[18] https://www.cartacapital.com.br/internacional/cubanos-poderao-viajar-ao-exterior-sem-pedir-autorizacao-ao-governo

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