O filme “A Onda” e sua limitação politicista

Die Welle (2008)

Por Wesley Sousa - graduando em Filosofia pela UFSJ

O filme “A Onda” (título original: Die Welle) é um filme alemão de 2008 dirigido por Dennis Gansel e estrelado por Jürgen Vogel, Frederick Lau, Jennifer Ulrich e Max Riemelt.

É inspirado no livro homônimo de 1981 do autor americano Todd Strasser e no experimento social da Terceira Onda, realizado pelo professor de história norte-americano Ron Jones. O filme foi produzido por Christian Becker para a Rat Pack Filmproduktion.

Obteve sucesso nas bilheterias alemãs e depois de dez semanas, 2,5 milhões de pessoas haviam assistido ao filme. No que se refere o filme, trata-se um experimento de um professor em sala de aula para com seus alunos sobre o que foi o nazismo. Aos poucos, sem perceberem, os alunos vão incorporando aspectos disciplinadores, agindo como um grupo uniforme e sem medir as consequências.

Enquanto isso, o professor passa apenas de um experimentador a um experimentado pela experiência, ou seja, ele mesmo se deixa levar pela “Onda”. Essa nova “Onda” começa a se solidificar na escola tendo seu modo de operação bem peculiar: autoritário e agressivo.

O filme nos mostra como as pessoas que se deixam levar pela maré são manipuláveis em prol de interesses específicos e bem duvidosos, apesar de parecer inocente e banal. Mas o aspecto mais intrigante: como pode se ancorar uma nova forma política que independa do sistema econômico? 

A reposta: não tem como ser independente. O próprio capitalismo engendra essas formas do pensar, ressuscitando ideias retrógradas do que há de mais repugnante, como a mão de ferro do Estado sobre a população menos favorecida.

A parte que se deixa a desejar, o filme mostra a imagem que o nazismo/fascismo nasce assim de forma “autônoma” e não como um aprofundamento da crise dos ideais burgueses, na crise do sistema capitalista que usa de um arranjo social quaisquer que sejam, para continuar com a exploração e opressão dos mais oprimidos para a reprodução de capital extraindo a mais-valia dos trabalhadores. Isso independe, sobretudo, se necessitamos de uma democracia liberal ou num autoritarismo militar.

Portanto, compreender o fenômeno nazista/fascista é, também, preciso compreender o efeito social disso: o despotismo de classe, a violência lucrativa e a dominação do povo. O publico alvo do filme, podemos dizer, pode ser dirigido aos alunos do ensino médio, por exemplo, visto o grau mínimo de consciência social e política que eles devam ter.

Assim, deixamos a ressalva sobre o filme, embora se trate de um retrato do real, alguns pontos, como o abordado, precisam ser esclarecidos. O filme ao sugerir essa concepção politicista (ou seja, que tudo que não é somente dos aspectos políticos possam ser resumidos a eles), abre margem para a interpretação arendtiana que, a grosso modo, a violência é uma forma não-política de mundo, esquecendo a autora que acima de tudo, dentro da sociedade de classes. Como já dizia Trotsky, a política é o lugar da violência. 

Nesse sentido, partindo da ideia que o nazismo/fascismo surge a partir do momento que há uma ausência do pensamento, como supôs outrora Hannah Arendt em um de seus livros, esquecemos que o próprio nazismo/fascismo teve como mentores intelectuais reconhecidos, como o filósofo Martin Heidegger e o jurista Carl Schmitt. Logo, é falsa a ideia que o nazismo/fascismo é a tal ausência do pensar. É nisso que o filósofo húngaro György Lukács irá rebater: não há ideologia inocente de maneira alguma.

Se lembrarmos de Mussolini, cujo o mesmo teve que prender o filósofo António Gramsci, pois o mesmo era subversivo aos ideais fascistas, vemos que o próprio fascismo italiano teve seus mentores, como mostra Norberto Bobbio no seu livro "Do fascismo à democracia". O fascismo teve seus aspectos ideológicos bem demarcados para penetrar nas camadas médias da sociedade italiana no período entre-guerras e num contexto de crise econômica que atingia quase toda a Europa, menos a parte leste sob liderança soviética.

O filme é de fácil acesso na internet, seja no Youtube seja em sites de filmes online. A partir do filme, podemos elaborar questões pertinentes, ainda mais em nossos tempos atuais com a crise do capitalismo cada vez mais latente, cujo emergem novas formas políticas de dominação e exploração de classe. Refletir sobre a “inocência” de um experimento aparentemente inofensivo para algo ainda maior: a concreção de uma forma de ver e atuar no mundo de forma alienada e obscurecida em nossos dias.
Wesley Sousa

Postar um comentário

Postagem Anterior Próxima Postagem