No
dia 10 de abril de 2019, cientistas divulgaram as primeiras imagens de um
Buraco Negro. Com essas imagens, a teoria da relatividade geral de Einstein foi
novamente confirmada, e elas nos mostram como a teoria da relatividade prevê o
que de fato acontece sob extremamente forte gravidade nos arredores de um
Buraco Negro.
Este
texto tenta explicar, de forma didática, o desenvolvimento do conhecimento astronômico e matemático, desde a Grécia antiga, Newton, Maxwell, Albert Einstein; do Big Bang aos Buracos Negros, de Ptolomeu à Teoria da Relatividade.
Escrito
por Ramon Carlos
Histórico
Desde
muitos séculos atrás, os povos antigos já tentavam compreender o universo,
mesmo antes de desenvolverem a ciência e a matemática. Nos dias atuais, temos
ferramentas poderosas, sejam elas materiais, como os computadores, telescópios
e radio telescópios, quanto as não materiais, como o método científico e a
matemática.
Nossa
astronomia moderna se desenvolve a partir do gregos antigos. Aristóteles, cerca
de 340 a.C, já apresentava argumentos para esfericidade da Terra, se baseando
em fatos como os eclipses lunares, momento onde a Terra, ao passar entre o Sol
e a Lua lançava sua sombra sobre a Lua. Outro argumento bastante conhecido, era
o de porque as embarcações que apareciam no horizonte eram vistas primeiro pelo
topo das velas, e gradualmente ia se revelando de cima para baixo. Se a Terra
fosse plana, você deveria ver a embarcação por completo, mas em escala
reduzida.
Os gregos tinham conhecimento de cinco planetas do nosso sistema solar, além da terra; Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno.
O modelo de Ptolomeu, assim como o pensamento de Aristóteles, coloca a terra no centro do Universo. Seu modelo era um conjunto de esferas em rotação, onde cada esfera era sucessivamente maior que a anterior. A oitava esfera determinava o fim de seu universo observável. Este modelo foi bastante preciso, e foi adotado pela Igreja Católica, deixando o “espaço vazio” depois da oitava esfera pertencentes ao paraíso e ao inferno.
Os gregos tinham conhecimento de cinco planetas do nosso sistema solar, além da terra; Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno.
O modelo de Ptolomeu, assim como o pensamento de Aristóteles, coloca a terra no centro do Universo. Seu modelo era um conjunto de esferas em rotação, onde cada esfera era sucessivamente maior que a anterior. A oitava esfera determinava o fim de seu universo observável. Este modelo foi bastante preciso, e foi adotado pela Igreja Católica, deixando o “espaço vazio” depois da oitava esfera pertencentes ao paraíso e ao inferno.
Modelo de Ptolomeu |
O
primeiro a propor a revolucionária ideia de que não era a Terra o centro do
universo, mas o Sol, foi Nicolau Copérnico. Um século mais tarde, vieram
Johannes Kepler e Galileu Galilei para apoiar as ideias de Copérnico.
Galileu
descobriu examinando Júpiter que haviam outros objetos girando ao redor de
outro corpo celeste que não a terra ou o Sol, como acreditavam Aristóteles e
Ptolomeu. Kepler passou a aperfeiçoar o modelo de Copérnico, sugerindo que os
planetas orbitavam em elipses, não em círculos, de forma que relação entre o modelo
as observações coincidissem.
Kepler
acreditava que o magnetismo era a força que fazia com que objetos tivessem
órbitas, fato que as órbitas elípticas não sustentavam.
A
resposta só veio mais de um século depois, com Isaac Newton e sua obra Philosophiae Naturalis Principia Mathematica
(Princípios matemáticos da filosofia natural).
Em
sua obra, Newton apresentou a lei em que todo objeto em repouso deve permanecer
em repouso, a menos que uma força aja sobre ele, e descreve os efeitos da força
sobre os objetos e seu movimento. E nos trouxe também a resposta de porque
orbitamos o Sol; A mesma força que faz com que objetos caem ao solo, em vez de
permanecerem em repouso, o qual ele chamou de Gravidade. Ele ainda inventou a
matemática que explica o comportamento de objetos quando afetados por forças
como a da gravidade, provando matematicamente o porque de os planetas orbitarem
o Sol em órbitas elípticas da teoria de Kepler e que as mesmas leis que se
aplicam à maçã que cai ao solo, se aplicavam as estrelas e aos planetas.
A
teoria da gravidade, além de prever o movimento dos planetas, mostra que os
corpos se atraem com uma força proporcional a massa de cada um e inversamente
ao quadrado da distância entre eles.
É
importante aqui dizer que, uma teoria é caracterizada pelo fato de fazer várias
previsões que poderiam ser refutadas pelas observações. Acontece que, quanto
mais as previsões coincidem com as observações, mais a teoria se sustenta, até
que algum dia, uma nova observação a desmonte, e uma reformulação (ou abandono)
precisa ser feito.
Na
prática, como observa Stephen Hawking, o que ocorre “é que uma nova teoria é,
na verdade, uma extensão da teria anterior”. Como o caso da Relatividade Geral
de Einstein e a teoria da gravidade de Newton, onde observações feitas em
Mercúrio seguiram corretamente as previsões de Einstein, mas divergiram
ligeiramente da de Newton. Ainda assim, usamos a teoria da gravidade de Newton
para grande parte das atividade práticas, já que as diferenças são pequenas e a
teoria de newton é muito mais simples.
A Relatividade
A
primeira coisa que precisamos saber, é que a luz se desloca a uma velocidade
finita, embora muito alta, e se comporta como onda e partícula (sem massa).
A persistência da Memória, de Dali |
A
velocidade finita da luz foi descoberta por Ole Roemer, quando analisava os eclipses
das luas de Júpter. Roemer notou que os eclipses não aconteciam em intervalos
regulares. Como Roemer sabia que a distância entre a Terra e Júpter não era
sempre a mesma, graças aos modelos das orbitas de Kepler (já que foi feita 11
anos antes da Obra de Newton ser publicada), ele notou que os eclipses aconteciam
progressivamente mais cedo quando Júpiter estava a uma distancia menor da
Terra, enquanto aconteciam mais tarde, quando Júpiter estava mais distante.
Para
que isto acontecesse, a luz precisaria ter uma velocidade determinável, que
demoraria um certo tempo para atravessar as distâncias em um intervalo de
tempo.
Nos
meados do século XIX, o físico britânico, James Clerk Maxwell, em seus estudos com
o electromagnetismo, elaborou uma teoria que implicava que ondas de luz
viajariam a uma velocidade fixa, o que não coincidia com a teoria newtoniana de
repouso absoluto, ou seja, implica que dependendo do referencial, a velocidade tem
um valor.
De
modo ilustrativo, tente imaginar que se uma bola é lançada a favor do movimento no interior de um
trem com velocidade ‘Vt’, e um observador assiste de dentro do vagão e outro
observador de fora. O do interior do trem, verá a bola com uma velocidade ‘v’,
enquanto o observador de fora a verá com a velocidade ‘v+Vt’. Temos então um problema aqui.
Para conciliar as teorias de Maxwell e Newton, foi proposto que a luz teria velocidade fixa no ‘éter’, uma maneira de ‘fixar’ um referencial para que a luz tenha velocidade fixa para este referencial, mas que para diversos observadores, ela teria também velocidades diversas.
Para conciliar as teorias de Maxwell e Newton, foi proposto que a luz teria velocidade fixa no ‘éter’, uma maneira de ‘fixar’ um referencial para que a luz tenha velocidade fixa para este referencial, mas que para diversos observadores, ela teria também velocidades diversas.
Esta
teoria foi derrubada, quando Albert Michelson e Edward Morley mostraram através
de um experimento, que a luz mantinha a mesma velocidade, comparando a
velocidade da luz medida através do movimento da Terra através do éter (em
diversas épocas do ano, de modo que a Terra estaria, hora de encontro, hora de
a favor do éter).
É
neste ponto em que aparece a figura, até aquele momento desconhecida, de Albert Einstein com
sua Teoria da Relatividade. Ela declarava que “as leis da ciência deveriam ser
as mesmas para todos os observadores que estivessem se movimentando livremente,
não importando qual sua velocidade” e conciliava a teoria de Newton com a de
Maxwell, eliminando a necessidade de haver um éter.
A
ideia é que, para que todos os observadores concordem sobre a velocidade de
deslocamento da luz, o que deveria mudar era nossa ideia de tempo.
Considerando
agora uma lanterna acesa para o caso anterior, do lançamento da bola dentro de
um trem em movimento; Se dois observadores, um dentro e outro fora do trem
analisarem o deslocamento da trajetória da luz, de forma que concordem com sua
velocidade, eles deveriam então discordarem do tempo em que durou o deslocamento.
Em outras palavras, o tempo passa de
maneira diferente, dependendo da velocidade do observador. É a partir daí
que surge o conceito espaço-tempo,
já que não podemos analisar o tempo de forma independente do espaço. Não se pode curvar o espaço sem curvar
também o tempo.
Mas,
cadê os buracos negros, hein?
Calma,
estamos chegando lá.
A
teoria da relatividade de Einstein incorpora o efeito da gravidade. Ela afirma
que a distribuição de matéria e energia deforma e distorce o espaço e,
consequentemente, o tempo. Ou seja, o espaço-tempo não poderia ser plano.
Isto
implica no fato de os objetos no espaço-tempo, apesar de tentarem se mover em
linha reta, acabam tendo sua trajetória deformada, pela curvatura do
espaço-tempo, como se estivem sendo afetadas pela gravidade.
O
fato de o espaço-tempo ser curvo implica que a luz também se curva perante
campos gravitacionais. Isto foi provado durante um eclipse solar, em 1919,
quando foi possível analisar a trajetória da luz proveniente de estrelas que se
passavam por trás do sol, e elas de fato eram defletidas.
Do Big Bang às Estrelas e Buracos Negros
Do Big Bang às Estrelas e Buracos Negros
Nos
momentos próximos do Big Bang (aqui são milhões de anos, tendo em conta que a
estimativa é de que o universo tenha aproximadamente 13.7 bi de anos) foram
formados os elementos de menor número atômico, como o Hidrogênio, o Hélio e Lítio.
A
medida em que o tempo ia passando, o universo ia se expandindo e se resfriando,
e novos elementos iam se formando, uma vez que sem os movimentos de alta
energia após o big bang, os elétrons e núcleos sucumbiriam às atrações
eletromagnéticas e se combinariam em novos elementos.
Nas
regiões onde houvessem mais matéria, a atração gravitacional desaceleraria a
expansão, fazendo com que houvesse uma contração e, dessa forma, a atração
gravitacional dessas regiões faria com que a matéria sob sua influência começassem
a girar em torno delas, mais rapidamente a medida em que ficasse menor. Este é basicamente
o surgimento de uma galáxia.
Galáxia M83 - da constelação de Hydra, por Ramon Carlos |
Com
o passar do tempo, o gás hidrogênio e o hélio dessas galáxias se dividiriam em
regiões menores e mais densas e, sofrendo influência de sua própria gravidade,
a medida em que os átomos se colidiam, a temperatura aumentava até que fosse
possível as fusões nucleares, responsáveis por converter hidrogênio em hélio. E
este é o nascimento de uma estrela, com violentas explosões nucleares da
transformação de hidrogênio em hélio. E não para por aí.
As
estrelas permanecerão estáveis por um longo tempo, alguns bilhões de anos, com
o equilíbrio entre a energia das fusões nucleares e a atração da gravidade. Mas
quando seu combustível acabar, ela começa a esfriar, e o equilíbrio se rompe. A
gravidade então começa a colapsar, aproximando os átomos uns dos outros,
fazendo a estrela se aquecer novamente, e passa a converter elementos mais
pesados. Primeiro, o hidrogênio era convertido em hélio. Depois, o hélio passa
a ser convertido em elementos maiores, como carbono e oxigênio.
Esse
processo não libera tanta energia quanto antes, e a estrela se colapsa a um
estado muito denso, como o que chamamos de Buraco Negro. Estrelas muito maciças também podem explodir, no
que é conhecido como Supernova, fenômeno
no qual material interestelar é arremessado de volta na galáxia, formando um
ambiente propício para novas estrelas surgirem
Como
foi demonstrado por Einstein, a luz, devido a sua dualidade onda-partícula,
esta sujeita à gravidade. Portanto, quanto mais massiva for uma estrela, maior
será a velocidade necessária para que algo escape de sua gravidade. Como a luz
tem uma velocidade finita (300.000 km/s), significa que estrelas muito densas
conseguem absorver a própria luz.
A primeira imagem de um buraco negro: M87* |
Talvez, agora, você esteja se perguntando: Mas afinal, o que a imagem revelada do M87* no dia 10 nos mostra, de fato?
Bom, se quisermos de fato ver o que se passa em um buraco negro, temos
que analisar seus entornos, já que o buraco negro em si não emitiria luz alguma.
Buracos negros, como o do centro de nossa galáxia, o Sagittarius A* e o M87*, possuem uma área ao redor, chamada disco de acreção. Neste disco, existem gases e poeira em um turbilhão caótico, girando a algumas frações da velocidade da luz, incrivelmente quente (alguns milhões de graus celsius). E é desta matéria que o buraco negro se alimenta e cresce.
A
região central de um buraco negro, é conhecida como Horizonte de Eventos.
Próximo ao horizonte de eventos, apenas a luz consegue orbitar, já que não
possui massa, como uma esfera de fótons ao redor do horizonte de eventos (com um raio 1,5x maior que o do horizonte de eventos). Cientistas sugerem que, se alguém pudesse
estar lá para presenciar, conseguiria ver a própria nuca, já que os fótons estariam
em órbita.
Feixes paralelos de luz e a relação entre a absorção de luz pelo horizonte de eventos e a região escura das imagens |
Como
foi explicado, buracos negros dobram o espaço-tempo o suficiente para que nem
mesmo a luz escape. Se imaginarmos luzes paralelas indo em direção ao buraco
negro; se forem muito próximas ao horizonte de eventos, serão sugadas para “dentro”
e nunca mais as veremos. Mesmo feixes de luz a distâncias próximas a da órbita
de fótons serão sugadas. Mas existe um limite; Este limite é um valor de 2,6 rs
(rs=raio do horizonte de eventos, que leva o nome do astrônomo alemão, Karl
Schwarzschild).
As
coisas ficam ainda mais bizarras... quando vemos (ou não, já que é
completamente negro) esta sombra, o que realmente esta acontecendo é que, ao
olharmos diretamente a ela, estamos presenciando todo o horizonte de eventos! A
sombra é, na verdade o mapeamento de todos os pontos do horizonte de eventos,
inclusive da parte de trás, onde as luzes paralelas próximas ao limite incidem,
proporcionando infinitas imagens do horizonte de eventos a medida em que aproximam
do limite de 2,6 rs. Portanto, incrivelmente, as primeiras luzes que vemos nas
bordas, são os raios de luz que incidiram e contornaram a esfera de fótons e
retornaram aos nossos telescópios.
Como
tudo isso acontece a velocidades próximas a da luz, as partes mais claras do
disco de acreção do M87* se referem as luzes girando em um sentido vindo de
encontro a nós, observadores, enquanto as regiões mais escuras representam a
luz girando em um sentido se afastando de nós. Este fenômeno é chamado de “irradiação relativística” e é facilmente notada pela imagem do M87* divulgada.
Espero que muitos tenham apreciado este momento histórico para a ciência, assim como eu.
Espero que muitos tenham apreciado este momento histórico para a ciência, assim como eu.