O limite da política e a política do capital

Foto István Mészáros


 Por Frederico Lambertucci - mestre em Serviço Social pela UFAL

Estava eu lendo em várias latitudes nesta rede social [Facebook] comentários discutindo a inflexão entre o apoio as eleições, concorrer e a abstenção, a recusa da formalização de escolher quem vai administrar o capital.  E o que mais me impressiona, sem dúvidas, é que aparentemente houve um esgarçamento das determinações reflexivas entre espaço-tempo-matéria e ao fim o tempo congelou.

Aparentemente não houve uma única mudança no capitalismo das primeiras vitórias eleitorais da Social-democracia alemã para cá. Todas as táticas e estratégias que Lênin defendeu permanecem válidas para toda a história do desenvolvimento capitalista – e observem, independentemente, inclusive, das vias e das formações sociais que corresponderam historicamente as posições dos capitalismos nacionais na divisão internacional do trabalho.

A participação eleitoral, mesmo em franca crise completa do sistema do capital e do Estado, como sinalizou Mészáros, uma crise verdadeiramente estrutural, permanece (não se tem clareza do porquê) “estratégica”. E o melhor, permanece estratégica porque espaço de denúncia. Oras, onde? Nos 9 segundos de TV que se possui? Se alguém consegue fazer qualquer crítica além de balbuciar o número de forma rápida, parabéns pela dicção e irresponsabilidade. Ou melhor ainda, em uma campanha que elevou como alcunha “revolucionária” o avançadíssimo, do ponto de vista do Fourierismo (ainda que os falanstérios constituíssem uma bela imagem social para a época), “amor contra ódio”.

Tal lema, factualmente, não despolitiza ninguém e remete ao cotidiano do trabalhador, afinal, ele pega ônibus lotado porque a empresa de ônibus bem como o prefeito e o motorista o odeiam, não porque a lógica interna do sistema é necessariamente orientada ao lucro e sua taxa constitui condição de operação e contínua operação dos capitais singulares sob o controle de capitalistas privados.

O preço do pão pode-se facilmente explicar pelo ódio que fez o mercado mundial oscilar preços. E as diferenças da riqueza social podem-se novamente ser explicadas de forma simples pela diferença entre aqueles que odeiam e por isso são egoístas o suficiente para acumular e aqueles que amam e carregam por isso o estigma franciscano de estar sempre do lado sofrido da história humana.

Pode-se assim fingir que com a saturação do mundo das mercadorias e do sistema do capital, não se arrastam as taxas de lucro dos anos 70 para cá e que mesmo aqueles operadores do Estado comprometidos ideologicamente com a classe trabalhadora (que raramente de fato chegam a postos de comando do Estado) podem fazer mais do que operacionalizar medidas para a manutenção através dos mecanismo estatais para compensação dessa mesma queda da taxa de lucro.

Assim, mesmo aquelas propostas realizáveis aparecem no máximo como paliativos passageiros, e mesmo essas se demonstram apenas como diferenças pífias entre os planos de governo da direita e da esquerda do capital. Pois, novamente, esgotam-se a cada dia aquelas medidas possíveis da reprodução capitalista que poderiam minimamente se pronunciar como pequena distribuição de renda, dado que as massas de capital necessárias a acumulação capitalista tencionam ao crescimento ao mesmo tempo que do ponto de vista produtivo o que se demonstra é a queda da massa de valor constitutiva do capital social total. Se configura, então, o capital fictício como válvula de quebra temporal entre o processo de valorização real da produção e a massa global de valor com que os capitais de fato são compensados.

Como se pode ver, de um lado, para compensar essa massa, não se pode simplesmente apaziguar a dívida pública com dividendos da própria dívida pública, logo surge a tendência necessária ao aumento da exploração da mais-valia, ao mesmo tempo que a mesma tendência reforça a expulsão do capital variável, da força de trabalho dos processos produtivos sob a necessidade objetiva da produtividade social do trabalho a fim de adquirir aumento de mais-valia ordinária e extraordinária e compensar a queda global da massa de valor.  É evidente, portanto, que a mesma tendência que intenta a compensar a massa de valor global na mesma lógica tende a diminuir a fonte da mesma massa. Tem-se assim o vetor da necessária dívida pública crescente o das milhares de operações financeiras que podem ser compreendidos sob a forma D - D'.

Na mesma medida, o que é evidente é a necessidade objetiva do Estado cumprir de forma muito mais destacada o papel de financiador em geral dos processos do capital produtivo e especulativo e ao mesmo tempo, o papel de principal comprador, na medida em que a mesma expulsão de força de trabalho tende a diminuição da massa do capital sob a forma de salários e assim a própria realização das mercadorias. (Surgem aqui a quebra temporal do crédito).

A questão fundamental que se pretende assinalar é que o neoliberalismo se constitui tão somente como a forma política econômica de objetivar a partir do Estado aquelas necessidades subterrâneas do capital na sua crise estrutural e que não podem ser compelidas a retornarem a qualquer estágio anterior do desenvolvimento do capital apenas com a mudança do operador político.

Diferente de toda a história da ascensão do sistema do capital, em que se podia falar com solo objetivo de uma possibilidade de dar vazão a certos interesses de classe, sempre colados a imediaticidade da vida cotidiana do trabalhador e sempre porque esses objetivos muito parciais eram ao mesmo tempo necessidades do próprio capital para realizar sua expansão, hoje estão exauridos aqueles interesses parciais de classe como a sua própria possibilidade objetiva de realização. Exaurida a potência histórica do capital, exauriu-se a possibilidade interna daquelas mediações que em algum momento permitiram a adequação dos interesses da classe trabalhadora no interior da lógica da acumulação capitalista e sempre com o proveito desta.

É nesse momento da história do sistema do capital que todas aquelas medidas defensivas do trabalho que puderam ter efetividade histórica vêem-se destituídas de toda sua viabilidade interna e só resta a ofensiva socialista. A partir daí a escolha é entre abdicar de radicalidade e cometer necessariamente estelionato eleitoral, pelo menos do ponto de vista daquelas candidaturas que intencionam de fato alterações estruturais de largo alcance (ainda que estas estejam ainda aquém das mudanças substantivas necessárias), e concorrer para a própria reprodução da ideia de que o Estado enquanto instituição ainda possui alguma possibilidade histórica de ser diferente do que é, ou... a partir das impossibilidades constatadas, apreender na via real do desenvolvimento histórico, aquelas formas organizativas que podem de fato dar vazão ao processo histórico de subversão da sociedade burguesa, formas essas necessariamente transpassadas pelo proletariado como seu sujeito consciente e fundamentadas na forma do trabalho.


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Wesley Sousa

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