Edison da Silva Palagi – estudante de graduação em Filosofia pela UFSJ.
A presente tarefa é parte dos estudos da disciplina de Educação na
Diversidade. Trata-se de um texto produzido como resposta a um suposto convite
para a escrita de um artigo para uma coluna chamada “Cidadão e Cidadã”. O tema
do artigo é “O papel do professor numa educação que respeita a diversidade”.
Os
nascidos há pelo menos 50 anos, mesmo nas grandes cidades, puderam experimentar
uma realidade que era bem outra. As verdades pareciam imutáveis, tudo dentro de
uma suposta normalidade. O bem e o mal se ajustavam segundo princípios
religiosos estabelecidos, digamos assim, desde sempre. Os iguais eram iguais,
os diferentes, diferentes e muito pouco, além disso, a considerar. Desquites
eram comentados em voz baixa e em famílias de descendência europeia o casamento
inter-racial tinha o poder de subtrair nomes. “Aquela lá” casou-se com um
preto. A questão de gênero era “absolutamente” resolvida. O lugar da mulher era
“naturalmente” em casa, como se isso determinasse a sua identidade. Do ponto de
vista religioso as diferenças eram claras e muito bem fixadas. Se de um lado
estavam os bons católicos, do outro estavam os espíritas e os (fale baixo),
macumbeiros.
De um
lado os bons, com costumes desde sempre estabelecidos a partir da genética cultural
especialmente europeia colonialista e paradigmática, do outro lado os outros,
com suas orientações (na época escolhas) sexuais distintas de uma suposta
normalidade (guardiã de uma misoginia e homofobia implícita, velada e impune),
além de suas culturas, práticas e comportamentos no mínimo equivocados. E assim
seguia a vida, sem muitos solavancos, pelo menos os que se podia ver...
Se
hoje, após cinco décadas, a atmosfera em alguma medida mudou, pode-se dizer que
permanecem os “ventos” da discriminação e exclusão de forma ainda fortemente
significativos, como algo a ser enfrentado em favor de uma cidadania segura,
madura e democrática, mesmo que diante de olhares conservadores estarrecidos
com tamanha velocidade, fluidez e impermanência das verdades no nosso tempo.
Que o diga Zygmunt Bauman (1925-2017), sociólogo polonês expulso da Polônia por
razões antissemitas no leste europeu pelos idos de 1968. Na fluidez baumaniana, as verdades, mesmo aquelas mantidas com forte
suporte teórico, parecem escorregadias e a modernidade líquida traria ao mundo
um incontável número de sinais inclinados a mudar de forma rápida e
imprevisível. Queiramos nós, ou não, é assim que a vida tem se mostrado...
É
nessa realidade veloz e líquida que transita a nossa educação para a cidadania nos
dias de hoje. Nesse espaço dialético movediço, valores como cidadania,
democracia, direitos, convivência, paz e diversidade, solicitam serem tratados,
desde tenra idade, com o rigor que merecem. É nesse espaço fundamental de
construção de cidadania que emerge a pessoa do educador.
Nas
mãos dos professores e educadores de uma forma geral, estão muitos dos imensos desafios
na formação de indivíduos conscientes, não só no universo velado do direito à cidadania
para parcelas historicamente privilegiadas da sociedade, mas no direito
inalienável de todo ser humano, indistintamente, gozar dos mesmos privilégios,
deveres e obrigações que perpassam todas as dimensões da sociedade humana.
Nesse sentido, o professor bem aparelhado em sua condição epistêmica e humanamente bem formado, tem nas mãos a argila do
oleiro. O docente, com isso, assume mediação autoral diante do desafio de
educar crianças e jovens para a diversidade. Não uma autoria legalista,
estática, que tende a parametrizar e uniformizar singularidades, mas uma
autoria diante daquilo que pulsa em sua criatividade múltipla, ativa e diversa.
Enquanto
os educadores entenderem-se como alguém que meramente transmite conteúdos,
estaremos envolvidos por um ensino conservador, desumanizado e inadaptado a um mundo
veloz e desconcertante. Assim sendo, nesse cenário dos nossos dias, o professor
é solicitado em sua perspicácia e criatividade a tornar-se um agente político
ativo de transformação. Afinal, a diversidade que sempre existiu, mas que foi
relegada ao ostracismo político-social, passou a ser a palavra da vez, ou pelo menos deveria, já que
diz respeito ao imenso potencial de atuação política, com força de intervir na
ordem social vigente, inclusive na coorganização para o estabelecimento de uma
educação que contemple, desde a edificação de políticas de Estado, até o beabá
cotidiano das escolas.
Mais
do que um transmissor de conteúdos e organizador de eventos e exposições muitas
vezes caricatas da força das etnias, por exemplo, o professor assume nos dias
de hoje um forte protagonismo cidadão, na construção conceitual e prática de
saberes que estabeleçam o trânsito seguro e viabilizador da participação de
todos e de cada um em suas diversidades e singularidades na construção de ambientes
humanizados, sustentáveis, diversos, mas coesos como corpo político de
cidadania participativa em todas as instâncias de poder.
REFERÊNCIAS
BERTASO, João Martins. Olhar Sistêmico sobre Cidadania e
Diversidade Cultural. Porto Alegre: RDU, Volume 13, n. 75, 202-217, 2017.
Disponível em:
https://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/direitopublico/article/view/2840
CARDOSO, Clodoaldo Meneguello. Fundamentos para uma Educação na
Diversidade. São Paulo: Acervo Digital da
Unesp/Redefor II/NEaD/Unesp, 2014. Texto 01 da disciplina 01
do Curso de Especialização em Educação Especial do Redefor Educação Especial e Inclusiva. Disponível em:
<http://acervodigital.unesp.br/handle/unesp/155243>. Acesso em: 14/06/2021.
GADOTTI, Moacir. Perspectivas atuais da educação. São
Paulo: São Paulo em Perspectiva, 2000. Acessado em 13/06/2021. Disponível em:
https://www.scielo.br/j/spp/a/hbD5jkw8vp7MxKvfvLHsW9D/?lang=pt&format=pdf