Por Wesley Sousa - graduando em Filosofia pela UFSJ.
Um dos grandes filósofos que tivemos no Brasil foi José
Chasin. Falecido em 1998, tomou para si uma empreitada aquilo que, seguindo
aqui o raciocínio de um filósofo marxista húngaro, György Lukács (2010, p. 59)
reforçou a ideia um “renascimento do marxismo”, contra as deformações sofridas
no séc. XX.
Esclarecimento preliminar realizado, a hipótese é
bastante clara e objetiva: recentemente foi publicado um texto intitulado “Chasin
entra em ação: crítica à “ontonegatividade da política”, no site LavraPalavra. O camarada Makaveli (Jones Manoel) em suas redes sociais, com apoio de sua trupe, vem disseminando desinformação acerca de autores que ele mesmo reconhece que não lê. O caso mais recente é de Chasin. Então, aparentemente, seu pupilo Fernando Savella ficou encarregado de escrever de olhos fechados aquilo que o mestre Jones não mostrou.
Ao ler o texto, percebeu-se
a necessidade de uma resposta ao tamanho descompromisso por gente que se diz
“revolucionária”, mas que não tem a seriedade da teoria pela qual advogam. Pois
bem. É preciso, antes de qualquer coisa, compreender que, dentro da militância comunista, uma visão que vem sendo engendrada que consignaram não apenas o pragmatismo da prática, mas o pragmatismo da teoria. Isso remonta bem a crise dos partidos comunistas e da perda do horizonte e a crítica teórica que revolvem-se aos militantes meras "práticas" imediatas como se fossem verdadeiras vanguardas do movimento comunista.
Sigamos com um trecho que inicia o texto, em que o autor rebate uma visão de Estado, para depois, usar desta premissa e elaborar sua tese.
Sigamos com um trecho que inicia o texto, em que o autor rebate uma visão de Estado, para depois, usar desta premissa e elaborar sua tese.
“O Estado se constrói como o ente que representa o bem geral, o interesse
geral, que representa o universal e supera os interesses particulares,
expressos na sociedade civil. A política, por sua vez, aparece enquanto a
disputa pelo sentido desse universal, o que é racional num sentido objetivo,
independentemente de interesses particulares que não devem se sobrepor uns aos
outros”.
A aparência
da coisa se coincidisse com sua essência, a ciência seria desnecessária. Por
que? Veja, mesmo que Lênin critique essa visão, ela cria uma cortina de fumaça
ao que pretende o autor no texto. Tangencia a discussão para a chamada falácia
do espantalho: recria um argumento e, nesse recriar, ataca-o como se fosse
verdadeiramente do autor criticado. Esse argumento falacioso, portanto, é
inválido.
Aqui, esse processo do Estado-racional hegeliano descrito, só pode ser efetivamente compreendido no aspecto que se dá no terreno, sobretudo, da Revolução Francesa (uma das últimas, senão de fato última revolução burguesa). Ali se buscou formas, no campo intelectual e ideológico, na estruturação e fundamentação desta práxis (pensamento e ação diante da realidade concreta) que, ao adequar os interesses concretos do capitalismo ascendente (cientificamente) e, também, no aspecto ideológico, conciliar “conflitos insolúveis” com a monarquia absoluta contida com seus resquícios feudais muito presentes e, também presente, com a ideologia religiosa cristã igualmente essencial: o fundamento da gênese do capitalismo, sua ontologia e a especificidade da mesma. Podemos identificar a partir disso que se falha em teoria, a prática também fracassa. A prática, na norma básica, é realização ou satisfação dos desejos, necessidades, aptidões e propósitos pessoais, etc. dentro do seio da sociedade humana.
Mais adiante, “argumenta” o
autor do texto:
“Como o
Estado, em sua forma de “representante do interesse geral” e, portanto, sua
disputa por meio da disputa da verdade e da superação dos interesses
particulares, é próprio de relações de produção historicizadas e é um
instrumento de sua reprodução, trata-se de um fenômeno ontonegativo, ou seja,
não é um elemento fundado ontologicamente, essencial da vida em sociedade dos
seres humanos – como seria, por exemplo, o trabalho. Na construção do conceito,
ainda, define como a ontonegatividade da politicidade, ou seja, da condição daquilo que é político. Sem uma
definição clara do que é o “político”, opera uma identidade entre política e
Estado burguês, assumindo um significado próprio da linguagem mainstream da
própria ideologia dominante que restringe o político à atuação dentro das
instituições representativas, e iguala o Estado burguês ao Estado socialista
enquanto uma mesma forma, que
seria, ela mesma, uma relação capitalista – questão à qual voltaremos mais a
frente”.
Essa visão intransigente,
porém, é muito superficial. A burguesia, todavia, à medida que se transfigura
de classe revolucionária em classe conservadora/reacionária se compromete a
engendrar uma época de decadentismo ideológico e de assalto à razão, os quais
estão diretamente ligados pelas relações de produção capitalista. De acordo com
as palavras do próprio Chasin:
Remeter a tal círculo
vicioso, é claro, vem com o propósito de recusar a concepção dualista de
realidade pressuposta pelo liberalismo, e fazer entender que a órbita
circular referida é o circuito institucional do capital, que consta da
totalização recíproca entre sociedade civil e estado (CHASIN, 2013, p. 23).
Por outro lado, veremos
Sergio Lessa e Ivo Tonet delineando que a crise que nos apresentam deixou de
ser um fenômeno intermitente para se converter no modo permanente de reprodução
da sociedade burguesa. Para tanto, não ser mero acaso que a luta política dos
que se pretendem subversivos se tenha convertido quase que exclusivamente em
luta eleitoral, uma luta que jamais se liberta das amarras do verdadeiro
problema, vedados, portanto, à fajuta luta burguesa. Isso evidencia cada vez
mais tais dilemas do pós-modernismo (como dissemos, com aspectos liberais). Entretanto,
leremos o que eles afirmam sobre o desarmamento teórico-crítico e, também,
sobre as alienações engendradas pelo capital:
Todas as contradições
sociais se intensificam em escala planetária. Enquanto uma crise revolucionária
não mostrar as possibilidades de um novo modo de produção, a humanidade e os
indivíduos vivem a história como se ela fosse um destino imposto por forças
não-sociais, não-humanas. As alienações se elevam a um patamar antes
desconhecido (LESSA; TONET, 2012, p. 73).
Mesmo numa gama de
contradições expostas acerca da politicidade burguesa, os movimentos sociais,
na busca “por direitos” – ainda que válidas, obviamente –, não reconhecem o
caráter de classe e opressor do Estado burguês que está em sua gênese.
Verdadeiramente “um patamar antes desconhecido” se tornou o grau de
contradições no seio da sociedade burguesa que a esquerda se encontra; o “campo
progressista” – onde se coloca o pós-modernismo – se vê apenas no jogo estatal
a sua única e exclusiva forma de atuação. Submetem-se apenas em um “programa”
político-partidário que jamais elevam os interesses dos trabalhadores de fato
(embora as lutas eleitorais em casos específicos sejam circunstanciais aos
partidos revolucionários).
Esse praticismo, ou seja,
uma forma voluntária de engajamento político tomada sem quaisquer mediações
críticas, faz com a a miséria da razão se torne um mundo sem razão. Na
militância, mais vale levantar bandeiras e gritar as palavras de ordem como se
isso apenas bastasse para a revolução do que o entendimento mesmo das
categoriais do cotidiano e da compreensão ontológica da realidade efetiva. Por
isso, Sérgio Lessa em seu livro “O revolucionário e o estudo: por que não estudamos?”,
acertadamente enfatiza o propósito pelo qual levou o título deste texto em
questão:
Como intenção, e não como
prática efetiva, é natural que o conceito de “revolucionário” perca clareza e
tenha os seus limites camuflados por uma prática que deseja, mas não pode efetivar
a revolução. O termo “revolucionário”, por isso, não tem como deixar de ser até
certo ponto ambíguo, contudo esperamos que, por vivermos todos esta
ambiguidade, sua utilização neste artigo consiga delinear com a clareza
minimamente necessária a qual universo nos referimos (LESSA, 2014, p. 80).
Não obstante, Savella em seu
texto tem um pressuposto que a política, entendida como uma certa “disputa”
entre opostos, teríamos o horizonte pelo qual:
“E por que
é possível pensarmos em “política” de forma mais ampla, mas não universal (ou
seja, ainda historicizada, só que enquanto instrumento de uma outra classe que
não a burguesia)? O fato de que a luta do proletariado pela revolução não é uma
luta pela destruição do poder político, mas sim pelo estabelecimento do poder
político de outra classe. Para Chasin,
a luta pelo poder político nas mãos do proletariado não passa de uma
tergiversação idealista, uma vez que a própria existência de poder político já
é uma forma de reprodução de relações capitalistas em si, e portanto a
revolução deveria ser social, e não política,
baseando-se na crítica de Marx a Hegel em que afirma que não é o Estado nada
mais que uma superestrutura das contradições da sociedade civil. A revolução política, para
Chasin, é a crença de que o Estado é o que determina a sociedade civil, e não o
contrário – portanto, uma crença idealista.”
Bem, dado que o autor sequer
busca uma afirmação de Chasin que corrobore isso. Iremos diretamente ao autor
criticado. E chega-se, pois, em um momento crucial: a determinação política, no capitalismo, assume forma objetiva, e a "política revolucionária", aparentemente efetiva, apenas cria uma ilusão de que as lutas "políticas" teria sua própria autonomia frente à reprodução de capital.
Em Marx, o estado e a
política em geral, como domínio separado, deve ser superado por meio de uma
transformação radical do complexo social. A ação social perspectivada não
poderá ser uma revolução política, mas social, sob pena de pagar o ônus de
ficar entravada dentro dos confins das formas políticas antiquadas. A revolução
social visa a remover a contradição entre parcialidade e universalidade que as
revoluções políticas do passado sempre reproduziram, submetendo a sociedade em
seu complexo ao domínio da parcialidade política, em benefício do setor ou
setores dominantes da sociedade civil. O agente social da emancipação é o
proletariado. As lutas políticas e socioeconômicas constituem uma unidade
dialética; consequentemente, descuidar da dimensão socioeconômica priva a
política de sua realidade” (CHASIN, 2013, p. 25).
Ainda que de forma não
necessariamente na mesma perspectiva de Lessa e Tonet, mas sustentando esse ponto de
vista que aqui me propus, de forma precisa, Vitor Sartori comenta:
No plano da filosofia
política e das teorias inseridas no campo do Direito, não são poucos também a
retomar as posições de um Bruno Bauer, por exemplo, que, atendo-se à “emancipação
política”, vem a defender os “direitos do homem” como algo que exigisse uma
real e efetiva universalidade na sociedade (SARTORI, 2017, p. 109).
A política existe antes do
capitalismo, é sabido e não há dúvidas. Contudo, no capitalismo que assume contorno
de complexos sociais, mas que, também vale ressaltar, “igualmente verdadeiro é
que ela não é uma espécie de demiurgo do real que possa ser vista enquanto
fundante da sociabilidade humana” (SARTORI, 2017, p. 110). Entretanto, os
“movimentos” sociais perderam seu caráter que, de outrora, era identificado
como sendo de matriz operária e revolucionária para se “adequar” à politicidade
burguesa.
Esse momento é importante:
segundo Fernando Savella elabora uma premissa fraca: no seu entendimento, “embora Chasin se
refira diretamente à obra de Marx como referência absoluta para sua
caracterização da política, esta crítica não pretende ser puramente teórica,
mas também dar conta dos efeitos práticos que tal confusão acerca da “política”
gera na estratégia socialista”.
Deixando de
lado a consideração de que o autor do texto não traga sequer uma citação de
Chasin, seguiremos com uma citação deste último:
O
politicismo é intrínseco à ordem do capital: a ordem econômica é natural, a
ordem política é o que resta para o homem configurar, e esta é decisiva, molda
a convivência e realiza a justiça. A economia é [vista como] uma espécie de
pano de fundo por si amorfo, ou melhor, uma plataforma virtual com várias
possibilidades, que será decidida pela política (CHASIN, 1999, p. 38).
O próprio
consumo de massa e o desenvolvimento de um processo civilizatório, ainda que
contraditório, deriva justamente das possibilidades e necessidades objetivas
fundadas lá no complexo da economia. E aqui que Chasin compreende Lukács
acerca da noção de capitalismo manipulatório. Nos dizeres de Lukács, “este mecanismo domina
todas as expressões da vida social, desde eleições do presidente até o consumo
de gravatas e cigarros” (2014, p. 66). A manipulação capitalista não é apenas
uma “alienação”, pois, esse complexo de alienações do mundo do trabalho
assalariado passa “aquela manipulação que vai da compra do cigarro às eleições
presidenciais ergue uma barreira no interior dos indivíduos entre a sua
existência e uma vida rica de sentido” (LUKÁCS, 2014, p. 67).
Mais do que isso, é importante trazer à discussão, o tratamento de um verdadeiro processo que não tem mais como único ponto de referência
a classe operária; sob este aspecto, ou seja, quanto à mais-valia relativa e à
manipulação, mesmo a camada intelectual e toda a burguesia estão igualmente
sujeitas ao capitalismo e às manipulações, não menos do que a classe
operária (LUKÁCS, 2014, 70).
Ainda que o autor do texto
possa usar a citação de Marx no Grudrisse, “O homem é, no
sentido mais literal, um zoon politikon; não é simplesmente um animal social, é
também um animal que só na sociedade se pode individualizar”, vale
ressaltar que a política posta e exercida sobre o entendimento da mesma, é sua
autopreservação conservadora. Essa derivação aristotélica não é errada, porém,
insuficiente, porque ignora o complexo da politicidade historicamente
determinada.
As manipulações que o capitalismo vai constituindo perante seus sujeitos existentes e que compõe o tecido social, revela-se um entrave do desenvolvimento do sujeito social, isso tudo sob tutela da mais-valia relativa. Sem a mais-valia relativa como predominante no processo de reprodução, não teria avanço nenhum em termos de diferenciação e dinamização da vida social na sociedade burguesa.
Então, percebe-se que o
“direito humano do capital” consiste, segundo as palavras de Marx, deixa
explícito aqui é o modo pelo qual o autor identifica no “Crítica ao trabalho de
Gotha”, ao criticar o direito como uma espécie de “consistir na aplicação de um
padrão igual de medida; mas os indivíduos desiguais” (MARX, 2012):
Esse igual direito é direito
desigual para trabalho desigual. Ele não reconhece nenhuma distinção de classe,
pois cada indivíduo é apenas trabalhador tanto quanto o outro; mas reconhece
tacitamente a desigualdade dos talentos individuais como privilégios naturais
e, por conseguinte, a desigual capacidade dos trabalhadores (MARX, 2012, p. 32).
Posteriormente, é clara a
ideia nos seus “Manuscritos Econômico-Filosóficos”, que Marx, supera a
antinomia burguesa de “indivíduo vs sociedade”.
No entendimento do autor, os indivíduos estão subordinados não apenas ao
processo produtivo, mas também dentro do mesmo que sua individualidade é
forjada, tolhida, reconhecida, descaracterizada, etc. Para que fique mais
claro, “o Estado passa a se regular em relação com a forma jurídica,
apresentando-se como necessário para a reprodução da sociedade da mercadoria” (MASCARO,
2017, p. 121). Dentro do capitalismo, Mônica Hallak Costa comenta também, ao
corroborar a ideia acerca da “expressão cabal desta desumanidade é que o homem
transforma-se em mercadoria. Isso para demonstrar a verdadeira falha
politicista que os jovens militantes de caserna adotam como postura “tática”,
soltando rojões de “leninismo”:
“A grande falha da concepção de ontonegatividade da política é seu apego
ao essencialismo: se uma forma de sociabilidade, a saber, a política enquanto
esfera relativamente autônoma de disputa de um aparelho de poder centralizado,
nasce como superestrutura do modo de produção capitalista, essa forma se torna
em essência uma forma capitalista e reproduzirá a sociabilidade capitalista
independentemente de qualquer coisa”.
Para responder isso
diretamente, retomemos fielmente as palavras críticas de Chasin. Segundo o
autor:
Em meados do
século, diante da contrafação reducionista do pensamento de Marx a discurso
político de justificação, e movida também por vetores teóricos extramarxistas,
que moldaram sua fisionomia, teve início a movimentação epistemologista em
torno da obra marxiana, cujo esgotamento é recente, mas em cujo prolongamento
atmosférico, em certa medida, ainda se vive. Porém, a dada altura de seu curso,
a sofisticação dessa inclinação reflexiva foi insuficiente para impedir a
contradita de uma nova reação de caráter político que, à unilateralidade
deformante do epistemologismo, pretendeu responder com a
unilateralidade igualmente deformante do politicismo –
identificação da reflexão marxiana como centrada e fundada na política (CHASIN,
2013a p. 37).
Chasin, em seus textos, com a devida preocupação e rigor que fazia sempre à menção aos textos de Marx “Introdução”, publicada posterior à
“Crítica à filosofia do direito de Hegel” ainda em 1843, uma filosofia já
distanciando do hegelianismo, permite-o fazer da “crítica do céu
transforma-se, assim, na crítica da terra, a crítica da religião,
na crítica do
direito, a crítica
da teologia, na crítica da política”
(MARX, 2013, p. 151 – grifos do autor). Por esta razão, percebeu ele em Marx
que a “tarefa imediata da filosofia, que está a serviço da história” seria a de
subverter à ideia, muito cara para a ideologia do liberalismo econômico/social
que “o homem não é um ser abstrato acocorado fora do mundo” (MARX, 2013, 151).
Novamente Chasin tem suas palavras:
Só através de uma analítica
desse caráter, isto é, do tratamento ontológico da política e de seu resultado
– a determinação negativa da politicidade – é que se torna
possível, então, e na mesma ordem de procedimento, reconhecer a importância da
política em sua efetiva especificidade e limites, ou, nas palavras ainda de
Marx: “Por certo, a emancipação política constitui um grande
progresso; não é todavia a forma final da emancipação humana em geral, mas é a forma
final alcançada pela emancipação humana no interior do mundo
tal como existe até agora. Entenda-se bem, falamos aqui da emancipação real,
prática”. (CHASIN, 2013a, p. 39).
Desta maneira, a luta de
classes é ponto chave para compreender tal fenômeno: a política é, sem
pestanejar, um efeito da luta de classes. Esse fenômeno que foi consolidado
apenas nos escritos de Marx, teve a genialidade de desvelar à luz do
materialismo histórico, sobretudo, como a luta de classes é travada não apenas
em um âmbito comumente entendido; mas, “no âmbito de uma minoria privilegiada,
entre os ricos livres e os pobres livres, enquanto a grande massa produtiva da
população, os escravos, compunha o pedestal meramente passivo para aqueles
contendores” (MARX, 2018, p. 19).
Adiante, lê-se do texto do LavraPalavra uma assertiva difícil de aceitar:
“As
condições encontradas pelas classes dominadas ao redor do mundo que organizaram
as revoluções socialistas, e as lições envolvidas no enfrentamento dessas
condições, passam direto pelos olhos de Chasin e não alteram a pureza de sua
teoria. Se o Estado burguês, a forma historicizada à qual Chasin se refere como
“política” de forma genérica, é um instrumento da dominação burguesa, a
conquista do poder pelo proletariado nas experiências socialistas do século XX
demonstrou que é também a forma Estado que constituiu o instrumento da
dominação do proletariado e seus aliados para combater a contrarrevolução e
gerir a produção e a sociabilidade no interesse dessas classes”.
Não apenas por uma descrição
singular de fatos históricos e políticos específicos, mas pela exposição das
disputas que se fazem na política burguesa desde então. Nesse ínterim, para que
possamos ir para além das formalizações de Estado ou da democracia
representativa que esbarra nos mesmos elementos e imperativos inexoráveis que
Marx enfatizara, há também um elemento que coaduna com a perspectiva das lutas
transformadoras que servem como guia para olhar ao futuro, não repetindo,
portanto, os erros anteriores.
Não é do passado, mas
unicamente do futuro, que a revolução social do século XIX pode colher a sua
poesia. Ela não pode começar a dedicar-se a si mesma antes de ter despido toda
a superstição que a prende ao passado. As revoluções anteriores tiveram de
recorrer a memórias históricas para se insensibilizar em relação ao seu próprio
conteúdo. A revolução do século XIX precisa deixar que os mortos enterrem os
seus mortos para chegar ao seu próprio conteúdo. Naquelas, a fraseologia
superou o conteúdo, nesta, o conteúdo supera a fraseologia (MARX, 2011, p. 28-
29).
Para finalizar, depois dessa
exposição, o que nos fica de lição, a partir da própria investigação
histórico-materialista de Marx, o marxismo e o advento da sociedade comunista,
ao compreender tais dinâmicas sociais da sociedade burguesa e ao compreender o
estabelecimento da luta de classes como pedra angular das perspectivas
histórico-mundiais. Somente nessa compreensão do real que Marx desempenhou
teoricamente, assim na habilidade para discernir, sob as aparências, as razões
efetivas das antinomias que caracterizaram essa época, confundem os
contemporâneos e desconcertam tantos filósofos e sociólogos atuais.
Poderíamos escrever muito
mais sobre o pequeno texto do garoto. Todavia, vale as palavras do próprio
Chasin, pelo qual assegura, contra esses mesmos “marxistas” panfletários: “a
postura analítica deve propender ao compromisso com a solidez dos vigamentos
que caracterizam a chamada análise
imanente ou estrutural”
(CHASIN, 2009, p. 25). Com isso, podemos compreender, tanto no marxismo tanto
nos textos em geral, todos o nexos, “como eventuais lacunas e incongruências
que o perfaçam” (CHASIN, 2009, p. 26).
Quem sabe da próxima essa
gente escute bastante quem tem muito mais a nos dizer...
REFERÊNCIAS:
CHASIN,
J. A morte da esquerda e o neoliberalismo. Revista
Verinotio – online. Belo Horizonte. n. 15, 2013a. Ano VIII, abr./2013, p.35-41.
CHASIN,
J. Marx: estatuto ontológico e
resolução metodológica. São Paulo: Boitempo, 2009.
CHASIN,
J. Democracia e emancipação humana. Revista
Verinotio – online. Belo Horizonte. n. 15, 2013. Ano VIII, abr./2013, p.22-27.
CHASIN,
J. Rota e prospectiva de um projeto marxista. In: Ensaios Ad hominem I, Santo
André, 1999, p. 3).
Costa, M. As categorias Lebensäusserung,
Entäusserung, Entfremdung e Veräusserung nos Manuscritos Econômico-filosóficos
de Karl Marx de 1844. Dissertação de mestrado. 177 p. Mônica Hallak Martins
da Costa. Orientação Ester Vaisman. Belo Horizonte: UFMG / FAFICH, 1999.
LESSA, S. O revolucionário e o estudo: por que não estudamos?. 1° edição. 2014.
LUKÁCS,
G. Conversando com Lukács:
entrevista a Leo Kofler, Wolfgang Abendroth e Hans Heinz Holz. 1° edição.
Tradução Giseh Vianna. São Paulo: Instituto Lukács, 2014.
LUKÁCS,
G. História e consciência de classe.
Tradução Rodnei Nascimento. Revisão Karina Jannini. São Paulo: Martins Fontes,
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LUKÁCS,
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ser social. Tradução Lya Luft e Rodnei Nascimento. São Paulo: Boitempo,
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MASCARO,
A. Direitos humanos: uma crítica marxista. Revista
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MARX, Karl. O 18 de brumário de Luís Bonaparte. Tradução e notas Nélio Schneider; prólogo Herbert
Marcuse. São Paulo-SP: editora Boitempo, 2011.
MARX,
K. Grundrisse. Tradução Mario Duayer
e Nélio Schneider. São Paulo: Boitempo, 2011. [versão digital]
SARTORI, Vitor. Direito e
politicismo no Brasil: para uma análise da conjuntura nacional pré e pós golpe.
Revista Revice - Revista de Ciências do Estado, Belo Horizonte, v.2,
n.2, p. 107-144, ago./dez. 2017.
TONET, Ivo; LESSA,
Sérgio. Proletariado e sujeito
revolucionário. São Paulo-SP: Instituto Lukács, 2012.
Que beleza de texto. Sou um leitor de Chasin, e muito me alimento de sua contribuição teórica assim como também lhe tenho criticas, mas a muito tenho percebido que há uma movimentação, cretina e baixa, para escantear Chasin como grande contribuidor ao pensamento brasileiro e ao marxismo, mas quem lê sabe a grandeza de José Chasin e de sua importância à razão.
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