por
Michael Roberts – economista e professor na University of Sussex.
Traduzido
por Wesley Sousa
Publicado
originalmente no site The
Next Recession
Data
06 de dezembro de 2019
Nota
inicial – Por Wesley Sousa (graduando em Filosofia pela UFSJ)
Alguns
dados quantitativos apontam que, em média, de 9 em 9 anos, desde 1838, o
capitalismo “sofre” com uma crise. Em outras palavras, a questão da “crise” no
capitalismo, como alguns de seus apologistas insistem, é uma espécie de “anomalia”
externa às suas dinâmicas. Por isso, caberiam “ajustes”: reformações em suas
bases distributivas, arrecadações, até mesmo “desregulamentações” do mercado
para que ele aja “livremente”.
Por outro
lado, também, surgem as “soluções” mais imediatas. Aquilo que apareceria como
elemento crítico do “socialismo utópico” vestiu a roupagem do “novo
socialismo”. Justamente o que o marxismo tem de mais potente – o poder
transformatório e revolucionário –, muitos propositalmente esquecem (ou fingem
esquecê-lo). Disso resulta um certo saudosismo da antiga União Soviética, os anticapitalismos mais recentes de algumas políticas de esquerda no interior do imperialismo,
como o caso cubano e venezuelano (ainda que legítimas, vale dizer).
A
socialização dos meios de produção nunca foi uma questão “democrática” no
interior do capitalismo, tampouco a “centralização estatal” da propriedade
privada (como insistem os apologistas do ‘modelo chinês’). Importa dizer que Marx
e Engels viam as cooperativas e, de fato, as próprias sociedades anônimas como
a forma “transitória” de propriedade entre o capitalismo e o socialismo, um
tipo de “superação” no interior do capital.
A questão,
porém, relacionada ao controle dos trabalhadores, no processo de coordenação e expansão
da gestão social da produção, requereria uma base orgânica na propriedade
comum, não apenas vinculada às “gestões democráticas” do capitalismo como força
motriz da lei do valor e da expropriação da riqueza. O ponto central, então,
nos chega: os lucros seriam para acumulação das mãos de empresas “democraticamente”
geridas pelo capital ou àquelas associações tomadas pelos e para seus
trabalhadores? A meu ver, o central para o debate da “transição ao socialismo”
passará, invariavelmente, por esse sentido, ao invés de “procurar” justificativas do
segundo tipo às crises do capitalismo.
O texto
de Roberts, no entanto, apesar de curto, traz a fagulha de um importante debate
para nosso futuro. Como aponta, o capitalismo é um sistema de um todo ordenado,
pelo qual o que perpassa no seu interior é o comércio de mercadorias, o assalariamento
e a inexorável exploração a nível global. Somente a mudança radical que oblitere
a forma social mundialmente, direcionando ao autêntico socialismo, será capaz,
nos dias de hoje, de deixar o capitalismo no museu da história, assim como foi
a roca de tear e a máquina à vapor.
Entendendo
o socialismo – por Michael Roberts
O
jornal The New York Times descreveu Richard Wolff como “provavelmente o
mais proeminente marxista da América”, que, possivelmente, não é um exagero
como uma descrição desse professor emérito de Economia da University de
Massachussetts e professor visitante da New School University, em New York.
Wolff
foi um dos poucos economistas marxistas com mandato integral em uma
universidade americana. Ele trabalhou incansavelmente para levar para casa
estudantes e todos que quisessem ouvir, nos EUA, a explicação alternativa
marxista da natureza do capitalismo americano e sua crise atual. Wolff tem
escrito vários importantes livros de economia, às vezes com seu colaborador,
Stephen Resnick. Em particular, seu recente livro, Contending Economic
Theories: neoclassical, keynesian and marxian [Teorias Econômicas rivais:
neoclássica, keynesiana e marxista], é muito útil e clara explicação das
principais vertentes da economia para quem não sabe. O programa semanal do
professor Wolff, Economic Update com Richard Wolff, está distribuído em
70 estações de rádio em todo o país e disponível em transmissão na Free
Speech TV.
Agora
[2019], Wolff publicou dois pequenos livros projetando a explicação das ideias
marxistas e socialistas de forma direta: “Entendendo o marxismo” e “Entendendo
o socialismo”. O primeiro é uma análise do capitalismo. Ele vai pensar os
conceitos de como competição se desenvolve entre os capitalistas (p. 51); como
o poder de trabalho é mercantilizado (p. 41). Qualquer indivíduo, ele diz, “exibindo uma personalidade instável comparada às instabilidades econômicas e sociais do
capitalismo teriam a muito tempo, já teria sido aconselhado a buscar ajuda profissional e
fazer mudanças básicas” (p. 61). Mas, o capitalismo manca sob a ameaça de
fazer com que todos sejamos levados para baixo com ele. Até que os
trabalhadores decidam democraticamente o que fazer para substituí-lo, então
isso continuará.
Como
disse Wolff: “Se você quer entender uma economia, não somente de um ponto de
vista das pessoas que a amam, mas também do ponto de vista das pessoas que são
críticas, e pensar que podemos fazer melhor, então você precisa estudar melhor
a economia marxista como qualquer tentativa séria de entender o que está
acontecendo. Não fazer isso é se excluir da tradição crítica”.
Wolff se concentra na descoberta central que a crítica de Marx ao capitalismo, nomeadamente a mais-valia, os empregadores se apropriam acima dos salários dos trabalhadores. Wolff
demonstra que os trabalhadores produtivos não são compensados por todo montante
total de seu valor trabalho. E isso constitui a exploração. Os expropriadores constituem uma mínima porcentagem da produção e controlam o que acontece com a
mais-valia. É essa relação de produção, insiste Wolff, que frustrou a promessa
democrática americana, francesa e outras revoluções burguesas; e esse
sistema de regras da minoria sobre a propriedade de ativos e sobre a força de
trabalho dos trabalhadores é também a causa de desigualdade impressionante que
aflige o mundo agora.
A
debilidade da narrativa de Wolff, ao que foi expressado em seu livro anterior,
é a explanação do porquê o capitalismo tem crises de investimentos, produção e
emprego, que prejudicam a vida de bilhões. Wolff adota o clássico argumento do
subconsumo de que os capitalistas pagam os “salários insuficientes para
permitir trabalhadores comprem a produção capitalista crescente”. Leitores
regulares desse blog [The Next Recession] sabem que eu considero essa
teoria das crises como errada! Marx rejeita isso; não se sustenta como uma
parte teórica de Marx da lei do valor ou rentabilidade; e a evidencia empírica
é contra.
No seu
segundo livro, “Entendendo o socialismo” [Understanding Socialism],
Wolff olha para várias experiências socialistas ao longo da história e sugere
um novo caminho para o socialismo, baseado na democracia do local de trabalho. O
socialismo permite a muitos o controle dos frutos de seus trabalhos. E isso
seria feito de forma democrática, com os trabalhadores votando sobre essas
preocupações, como democracia é estendida muito além de votos para políticas e
iniciativas de cédulas, ao chão de fábrica, escritório, etc.
O foco
de Wolff sobre essa democratização do local de trabalho é a base do futuro
socialista. Wolff corretamente enfatiza que a base econômica do socialismo é o
controle coletivo dos meios de produção. Mas está preocupado em não adotar o
modelo de planejamento central que falhou na URSS, como ele vê. Então ele quer
descentralizar a democracia através de cooperativas de trabalhadores. Para ele,
a solução para as recorrentes crises e o aumento da desigualdade reside na “mudança
de estrutura de classes dos empreendimentos capitalistas” e na substituição por “empresas dirigidas por trabalhadores”.
Wolff
está preocupado, com razão, em corrigir a visão de que a alternativa socialista ao
capitalismo é simplesmente a propriedade pública e o planejamento nacional das
maiores corporações. Sem democracia [seja lá o que isso signifique] e o
controle dos trabalhadores ao nível de cada empresa não pode haver um real desenvolvimento
socialista. Caso contrário, os funcionários estatais apenas seriam substituídos
a um capitalismo de conselho diretores. Isso é “insuficiente conceitualmente
e estrategicamente”.
Mas Wolff que incluir e enfatizar a regra que ele chama de Empresas autocontroladas por trabalhadores (WSDE’s]. Para mim, isso me parece estar nos levando para outro caminho, ou seja, se aproximando das ideias de Fourier e Robert Owen [“socialistas utópicos” combatidos por Marx e Engels]. Trabalhadores de cooperativas sem planejamento implicam que os mercados continuarão a regular as cooperativas, abrindo portas para forças da lei do valor, ao contrário de direcionar as forças produtivas ao interesse social como um todo. Uma coisa é alcançar a “democracia no local de trabalho”, mas não é saltar da frigideira do fogo, nos levando a economia mais ampla para os poderes do mercado?