Uma coletânea de pequenos textos recentemente publicados
pelo professor do Instituto de Economia da UFRJ, João Sicsú. A postagem em questão foi tirada do blog Bora Discutir, do também Economista Allefy Matheus.
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4 MENTIRAS SOBRE A PEC 241
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“Reverter, no horizonte de médio e longo prazo, o quadro de
agudo desequilíbrio fiscal em que nos últimos anos foi colocado o Governo
Federal” (do texto da PEC).
O déficit público orçamentário
(ou nominal), desde 2003, sempre esteve em patamar aceitável (média do período
2003-2013 = 3%). O que houve foi um aumento preocupante desse déficit no ano de
2014 (para 6,07% do PIB). Contudo, suas causas são conhecidas: o pagamento
exorbitante de juros da dívida pública devido às elevadas taxas Selic (R$ 311
bilhões), as exageradas desonerações tributárias das atividades empresariais
(perda de mais de R$ 100 bilhões) e a fraca arrecadação em decorrência do baixo
crescimento (aumento do PIB de apenas 0,1%).
O quadro fiscal de
desequilíbrio agudo ocorreu somente no ano de 2015 quando foram adotadas
medidas severas de cortes de gastos públicos (que provocaram uma grave recessão
de 3,8% do PIB, com queda da receita de 3% em termos reais). Em 2015, sob uma
política de austeridade fiscal conjugada com gastos descontrolados de juros
referentes à dívida pública (aumento dessas despesas foi de 62% em relação à
2014 enquanto a inflação do ano foi de 10,67%), o déficit orçamentário saltou,
então, para um patamar inaceitável de 10,34% do PIB.
Nossas dificuldades fiscais
advêm dos exagerados pagamentos de juros da dívida pública que decorrem das
elevadas taxas Selic que são praticadas pelo Banco Central. E para conter esse
desperdício de recursos públicos, a PEC nada propõe. Muito pelo contrário, esse
é único gasto do governo que não está limitado pelas regras da PEC 241.
2/4
“Recolocar a economia em trajetória de crescimento, com
geração de renda e empregos” ou “numa perspectiva social, a implementação dessa
medida [a PEC 241] alavancará a capacidade da economia de gerar empregos e
renda...” (do texto da PEC 241) .
Não é explicado COMO a
economia pode crescer a partir de um freio nos gastos públicos do governo
federal. O crescimento de uma economia tem que ocorrer necessariamente pelo
crescimento do consumo ou do investimento privado ou das exportações (menos as
importações) ou dos gastos do governo (inclusive seus investimentos).
Qualquer desses canais pode
influenciar os demais. As exportações estão se enfraquecendo porque o Banco
Central está deixando o câmbio se valorizar. E a contenção de gastos públicos
indicado na PEC terá efeito negativo sobre o consumo e o investimento privado.
Portanto, não há nexo com a teoria econômica nem com a realidade entre a
contenção de gastos públicos (proposta na PEC) e uma possível trajetória de
crescimento da economia (prometida na PEC).
3/4
A PEC 241 objetiva eliminar a
suposta raiz do problema fiscal: “a raiz
do problema fiscal do Governo Federal está no crescimento acelerado da despesa
pública primária” (do texto da PEC 241).
Gastos públicos devem crescer
(ou decrescer) em função da arrecadação do governo, de sua capacidade de
endividamento saudável e das necessidades da sociedade. O crescimento de gastos
públicos acima ou abaixo da inflação não significa absolutamente nada. O
aumento real dos gastos públicos não implica necessariamente piora dos
resultados das contas públicas ou melhoria na qualidade de vida da população.
Bem-estar social e organização fiscal dependem de outros fatores, por exemplo,
aumento da arrecadação, crescimento populacional, despesas com o pagamento de
juros da dívida pública e demandas sociais.
A raiz do déficit público
brasileiro, ou seja, a sua principal causa é o pagamento de juros da dívida
pública devido às altas taxas Selic praticadas pelo Banco Central. E não o
excesso de gastos primários(saúde, educação etc). Nos últimos cinco anos
(2011-2015), a despesa com o pagamento de juros cresceu 111,8%, enquanto a
inflação do período foi de 39,4%.
4/4
A PEC 241 pretende criar as
condições para a redução das taxas de juros:
“certamente a contenção do crescimento do gasto primário, em uma perspectiva de
médio prazo, abrirá espaço para a redução das taxas de juros, seja porque a
política monetária não precisará ser tão restritiva, seja porque cairá o risco
de insolvência do setor público” (do texto da PEC).
Diferentemente do que é
argumentado no texto da PEC, o Banco Central não alega que não reduz a taxa de
juros Selic devido à política de gastos do governo federal. O argumento do BC é
a necessidade do controle da inflação. É o que é dito nos documentos oficiais.
Também são mentiras. A verdade é que os juros são altos para que haja uma
brutal transferência de renda de toda a sociedade (via setor público) para
banqueiros e rentistas.
O outro argumento mentiroso é
que a taxa de juros Selic poderá cair porque haverá redução do risco de
insolvência do setor público. Entretanto, não há nenhuma relação entre taxa de
juros Selic e grau de insolvência do setor público (considerando os atuais
patamares da Selic).
Os credores do governo federal
sabem que o risco de insolvência do setor público é desprezível, que o governo
sempre honra com os seus compromissos - em detrimento inclusive de áreas
sensíveis como saúde e educação.
Os credores aceitam os atuais
14% ao ano de juros como remuneração para a aquisição de mais títulos, mas
aceitariam 13%, 12%, 11% etc. Nós não sabemos qual é o piso de taxa de juros
capaz de rolar (ou não) a dívida pública porque nunca arriscamos conhece-lo.
Se tivéssemos realizado uma
redução significativa da taxa de juros Selic, poderíamos conhecer a relação
entre piso de juros e risco de carregamento de títulos públicos. Mesmo quando a
presidente Dilma decidiu reduzir a taxa Selic no ano de 2012, os “gritos” não
eram que títulos não seriam comprados àquela taxa devido ao risco de
insolvência do setor público, mas sim que a inflação era alta e descontrolada
(associado ao blá-blá-blá que “taxa de juros não se reduz por decreto”).